domingo, 13 de junho de 2010

UM CORPO QUE DANÇA


Cintia Napoli separou um tempo na agenda lotada para receber a reportagem no Vila Arte Espaço de Dança. O lugar fica em um prédio antigo, cuja idade é denunciada pela altura da porta de entrada, um dos muitos sobrados centenários da Rua Saldanha Marinho, em Curitiba. Em uma das salas, ensaiam os bailarinos da desCompanhia de Dança - Juliana Adur, Peter Abudi e Yiuki Doi - e, em outra, a diretora conversa sobre o seu trabalho.

Cintia Napoli completa 50 anos no dia 10 de outubro e este ano também comemora 45 anos de carreira. Aos cinco anos ela iniciou na dança com o balé clássico ainda na cidade natal, São Caetano do Sul (SP). Como integrante do Ballet Teatro Guaíra, atuou na montagem do musical O grande circo místico, em 1984, um dos espetáculos de dança mais famosos do País, com trilha sonora assinada por Chico Buarque e Edu Lobo.

Mas o tempo acabou ressaltando uma vontade que apareceu naturalmente, o interesse pela dança contemporânea. Hoje, a sua principal atividade envolve a desCompanhia, cuja proposta é trabalhar técnicas corporais para disponibilizar e situar o corpo na contemporaneidade. Nesses últimos dias, o grupo retoma os ensaios do espetáculo Lugares de mim, que volta para duas apresentações, dias 18 e 19 de junho, no Teatro do Sesc da Esquina.

O projeto com o qual a companhia está envolvida agora explora as particularidades com que cada um se relaciona com o mundo através do olhar: A poética do olhar. Merleau-Ponty, um dos teóricos estudados neste início de processo, define o olhar como algo que foi comovido por um certo impacto do mundo. O trabalho compartilha da ideia de que o exercício do olhar seria uma prática de corpo inteiro, num trançado de visão e movimento.

Com a fala pausada e o cuidado em ser generosa com os seus companheiros de trabalho, Cíntia lembra como a dança está inscrita em sua vida.

O Estado: Você começou como bailarina clássica e depois passou a atuar também com dança contemporânea? Como foi esse processo?

Sim, comecei com o balé clássico aos cinco anos por indicação médica e depois de muitos anos conheci a dança contemporânea. Esse processo aconteceu naturalmente. Fui escolhendo meu caminho e com muita curiosidade fui fazendo minhas escolhas de acordo com a necessidade do meu corpo.

O Estado: Como a sua experiência com balé clássico influência o seu trabalho em dança contemporânea?

Todas essas experiências fazem da minha dança ser o que é. São conhecimentos assimilados por um único corpo. Porém percebo que a maturidade e a consciência corporal me propiciaram uma nova percepção do movimento, tanto do ballet quanto da dança contemporânea.

O Estado: Como foi a sua entrada no Balé Teatro Guaira?

Depois de 14 anos de formação no balé clássico, em São Paulo, ingressei no Balé da Cidade de São Paulo. Essa foi a minha primeira experiência em uma companhia profissional. Ainda no mesmo ano, 1980, fui aprovada em uma audição para compor o elenco do Balé Teatro Guaira.

O Estado: Você começou a trabalhar com dança nos anos 80. O que mudou de lá para cá?

Muitas coisas mudaram. Naquele momento o bailarino preocupava-se em ser um bom intérprete com técnica cada vez mais apurada, não se falava ou falava-se pouco de pesquisa e movimento autoral. A estrutura de grandes companhias satisfaziam os desejos dos artistas daquela época. Depois de um certo tempo esse formato começou a não ser suficiente para tantas particularidades, para expressões tão diversas, o bailarino passou a ser um criador do seu próprio movimento.

O Estado: Como surgiu a vontade de atuar também como coreógrafa?

A profissão oferece vários caminhos, vários desdobramentos que necessitam de tanto estudo e dedicação quanto ser bailarino. Cada experiência dessa, relacionada ao movimento, me provoca curiosidade, desejo de aprofundamento e me mantém atualizada. Ser coreógrafa é um deles.

O Estado: Qual o tipo de pesquisa desenvolvida pela desCompanhia de dança?

A desCompanhia trabalha unicamente com processos colaborativos. Atuo como diretora artística da companhia, entendendo como direção um lugar de organização e de orientação. O processo de criação é discutido e desenvolvido por todos os integrantes, inclusive equipe técnica. Os bailarinos Juliana Adur, Peter Abudi, Yiuki Doi e eu trabalhamos diariamente, subsidiados ou não, desenvolvendo estudos teóricos e práticos.

O Estado: O que você gosta de ver em um espetáculo de dança?

Gosto de ver propostas surpreendentes e inspiradoras, espetáculos de bom gosto e com bom acabamento, coerência e atenção com o público e de preferência espetáculos que o elenco tenha muito conhecimento da causa.

O Estado: Como aconteceu a participação em óperas e como isso se relaciona com o restante do seu trabalho?

A participação em óperas faz parte do momento em que atuei como bailarina do Balé Teatro Guaíra. A convivência com músicos, cantores, atores e bailarinos em um único espetáculo é uma experiência riquíssima. Isso tudo faz parte do meu repertório de vida, não tem como não se relacionar com meu trabalho.

O Estado: Como surgiu a vontade de montar um espaço próprio para o ensino da dança, o Vila Arte Espaço de Dança?

A vontade de montar um espaço foi, de certa maneira, consequência de uma crise. A dança que eu estava fazendo não cabia mais no meu corpo, os métodos de ensino que eu observava não eram coerentes com aquilo que eu acreditava, enfim, era chegado o momento de criar o meu espaço e ter pessoas com o mesmo propósito do meu lado. E aí está o Vila Arte com oito lindos anos de vida.

O Estado: Que artistas você admira?

São tantos. Mas admiro todos os que trabalham, os apaixonados, os íntegros, os competentes e principalmente aqueles quenão se esquecem que não seriam artistas se não tivesse o público para apreciar sua arte.

O Estado: Quais os seus próximos projetos?

Estamos trabalhando na criação de um novo espetáculo. O projeto A poética do olhar foi contemplado no Edital de Difusão em Dança da Fundação Cultural de Curitiba, ainda sem data prevista para a estréia.

A companhia já tem um grande material de pesquisa que pode ser compartilhado com os interessados através do blog: www.apoeticadoolhar.blogspot.com.

MATÉRIA publicada no jornal O Estado do Paraná
por PAULA MELECH
foto DANIEL CARON

sábado, 12 de junho de 2010

OS NOVOS RUMOS DE MALLU


Apostando em uma sonoridade mais brasileira e flertando com o ska jamaicano, a cantora e compositora Mallu Magalhães abre espaço para novos ritmos em seu segundo disco, intitulado com o seu nome.

O CD, lançado no ano passado, aponta novas direções na carreira da cantora de 17 anos - talvez a principal seja a proximidade com a MPB, influência que se reflete tanto nas melodias quanto nas letras. Desta vez, seis das 13 faixas são cantadas em português.

Hoje, o público de Curitiba poderá conhecer de perto este novo trabalho, em uma única apresentação no TUCA, o Teatro da PUC. Este é o segundo do projeto PUC Muito Mais, que trará Marcelo Camelo, namorado de Mallu, para o terceiro show da série.

A cantora define o álbum como um reflexo de “uma nova fase”, onde o processo de escolha das músicas é influenciado por figurões da música brasileira, como Chico Buarque, Caetano Veloso e Nara Leão. Ao mesmo tempo, Mallu resgata influências do folk, gênero que marcou o disco de estreia e as suas primeiras referências.

O responsável pela sonoridade múltipla - resultado do repertório eclético - é um dos mais aclamados produtores dos últimos tempos, o carioca Kassin, do qual a cantora é fã declarada. “Ele tem o conhecimento necessário para unir ambos os lados, a música brasileira e americana, da forma mais perfeita”.

Melodicamente, a cantora abandona alguns instrumentos explorados no primeiro trabalho, como a gaita e o banjo, e experimenta o violão de náilon, o vibrafone e a formação de quarteto de cordas.

Outra novidade é que ela ainda aparece produzindo uma faixa, O herói e o marginal, inspirada em Hélio Oiticica. “O disco é um retrato dessa mudança, é um segundo passo da minha carreira, que agora está mais consolidada”, analisa.

As coisas acontecem rapidamente na vida de Mallu. Aos 15 anos, ela postou suas composições no site de relacionamentos MySpace e ficou conhecida como o primeiro fenômeno musical da internet no Brasil.

Em meio aos milhares de músicos que tentam visibilidade por este meio, a cantora se destacou pela originalidade das músicas em estilo folk e compostas em inglês.

Algo que fica evidenciado neste disco é uma Mallu compositora “mais crescida”, que busca através das palavras refletir sobre si mesma diante das situações da vida. “É uma busca sincera pelo meu retrato, uma busca por mim mesma. Sinto que isso é muito livre, voador, vai para qualquer lado”.

Antes de ser um trabalho novo, para a cantora este é um álbum de transição, que aposta nas experimentações e a coloca mais segura de suas escolhas. “Adquiri a certeza de que é isso que eu quero fazer. Quando as coisas começam a acontecer você cria força. Estou muito feliz e pretendo continuar nesse caminho”.

Serviço

Show de Mallu Magalhães. Hoje, às 20h, no Teatro da PUC (Rua Imaculada Conceição,1155. Prado Velho). Ingressos a R$ 60,00 (inteira). Alunos da PUC pagam R$ 15,00. À venda na PUC Store, Livrarias Curitiba e no Alô Ingressos. Maiores informações: (41) 3271-4749.